sábado, 17 de março de 2012

O Ìtán Princípio eo Fim

O africano conta itans (histórias) para explicar diversas situações, principalmente as situações que interagem as energias dos Orixás e seus poderes e domínios.
Contam que, em terra da África, “Nanã, o ventre mãe de todas as gerações – senhora do portal da vida e da morte”, determinou, em caráter irrevogável, que nenhuma pessoa do sexo masculino teria acesso ao Mundo dos Mortos.
Òlufón, o grande Orixá funfum, inconformado com a decisão de Nanã, não somente por ser seu esposo, mas também pela sua condição diante dos demais Orixás, resolveu contornar a situação, colocando-se a seu favor.
Òlufón tinha ciência de que, ao Transpor o portal da vida e da morte, correria o risco de ficar retido no mesmo, mas, mesmo assim, seguiu Nanã sorrateiramente quando a mesma se dirigiu ao Mundo dos Mortos, aproveitando-de do descuido do portal aberto.
Sem que Nanã percebesse, Òlufón observou todos os seus atos e procedimentos junto aos mortos, nada passou despercebido ante a Òlufón, a tudo ele ficou atento: a entrega das folhas, as cabaças, o instrumento que os invocava, enfim, toda a liturgia e ritual da vida, da morte. No entanto, o que mais chamou atenção de Òlufón, foram os cântigos, uma vez que, Nanã ao invés de entoá-los, gungunava.
Após a realização de todos ritual, Nanã voltou ao àiyé, sem perceber que Òlufón a tinha seguido e voltado com ela do Mundo dos Mortos. Ao voltar para o àiyè, Òlufón engendrou um plano para entrar no Mundo dos Mortos e passar para sí os mesmos poderes atribuídos a Nanã. Antes de retornar, para executar seu plano, Òlufón entrou escondido nos aposentos de Nanã, apoderou-se de seu cetro e da sua coroa, colocando-a imediatamente sobre a sua cabeça e em seguida cobrindo-se totalmente com o manto preto e outro feito de palha da costa trançada em forma de rede, vestimenta essa que servia Nanã quando a mesma participava do ritual da vida e da morte. Após isso, Òlufón seguiu rumo a outra dimensão.
Totalmente disfarçado com as vestes de Nanã, Bagbá Òlufón chegou ao Mundo dos Mortos, tratando logo de executar seu ardiloso plano, procedendo da mesma maneira que Nanã. Entretanto, com apenas uma exceção, ao invés de gungunar com os mortos, Òlufón falou-lhes: ” A partir de hoje, vocês obedecerão também ao meu esposo Òlufón. Os desejos e as determinações dele deverão ser cumpridas. Sempre que ele fizer algum pedido, vocês deverão atendê-lo”.
Enquanto Òlufón executava seu astucioso plano no Mundo dos mortos, do outro lado da dimenção, Atioró, o pássaro sagrado que fica ostentado sobre o cajado de Nanã, não cessava de gritar, indo e voltando ao mundo dos mortos.
Nanã, ao perceber ao perceber que algo de anormal estava acontecendo no reino dos Mortos, seguiu imediatamente para o local, chegando justamente no momento que Òlufón terminava seu habilidoso plano. Nanã tentou de todas as maneiras desfazer a trama de Òlufón mas todos os seus esforços foram inúteis, os Egúns não reconheceram a sua voz, pois ela não falava com eles antes, apenas gungunava.
Irada como o procedimento de seu esposo, Nanã pronunciou-se: ” Não tenho como desfazer sua trama, serei obrigada a compartilhar contigo o segredo da morte, portanto, a partir de hoje, serás aquele que tocará o cajado/Oparun por três vezes consecutivas sobre a terra, prenunciando o fim de um ciclo, isto é, a morte de um ser humano.
Não satisfeita e ainda enraivecida, Nanã setenciou: ” Òlufón, em virtude de tua afronta, de hoje em diante, carregarás para sempre sobre teu ombro esquerdo o pássaro Atioró. Aceitarás, tal como eu, somente oferendas de animais do sexo feminino deixando assim de aceitar unicamente animais portadores de sangue branco.
Texto adaptado.

Oferendas ambientamentes corretas


Praias, Mares, espaços naturais e sagrados.
Integrantes de religiões de matriz africana assessoram a Secretaria Estadual do Ambiente, na criação de uma cartilha que orienta fiéis a não causarem danos a rios ou florestas na hora de depositar oferendas. O material sugere, por exemplo, o uso de recipientes recicláveis. Um parque para oferendas será criado em Nova Iguaçu, município do Rio de Janeiro. Não acender velas nas matas, uso de materiais biodegradávis, não deixar resíduos, preservação dos sítios naturais, etc.
Uma conscientização que todo terreiro deve ter principalmente nos despachos, orientando e dando exemplo de cidadania social. Não basta ter um fio de conta no pescoço, temos que ter um fio de esperança na alma para preservar nosso parque nacional.

Dia da África - 25 de maio

Escolhi esse maravilhoso artigo de Mãe Stella de Oxóssi porque sintetiza de forma didática, límpida e com muita sabedoria o dia da África, 25 de maio. Bênção, Mamãe África.

Maria Stella de Azevedo Santos- Iyalorixá do Axé Opo Afonjá -BA

Ainda de pouco conhecimento da sociedade é o fato de hoje, 25 de maio, se comemorar o Dia da África. Data escolhida porque em 1963 a Organização de Unidade Africana, hoje com o nome de União Africana, foi fundada com o objetivo de ser, internacionalmente, a voz dos africanos. Hoje, o Terreiro Ilê Axé Opô Afonjá está recebendo uma média de cinquenta professores da rede municipal, juntamente com o seu secretário, para conosco comemorar este dia, que se constitui em uma tentativa de que os olhos e os corações do mundo se preocupem e se ocupem de cuidar do povo desse continente, mas também de aprender e apreender sua sabedoria, que, como neta de africana e iniciada em uma religião que tem em África sua matriz, foi a mim transmitida. Oportunidade que tudo faço para não desperdiçar.
Muitas sementes da sabedoria dos africanos, em mim plantadas, ainda não encontraram terreno fértil para germinar, mas não desisto e, por isso, cuido desse terreno em todo momento. Outras há, no entanto, que cresceram e até deram frutos. Foi assim refletindo que resolvi homenagear o berço da humanidade – a África -, aproveitando este precioso espaço de comunicação que a mim foi concedido para, humildemente, tentar espalhar essas sementes, na esperança que elas caiam em terrenos férteis.
Foi através da tradição oral, chamada na língua yorubá de ipitan, que entrei em contato com a maravilhosa arte de viver do africano, que tem na alegria um de seus fundamentos. Entretanto, nós brasileiros, que temos nesse povo uma de nossas descendências, não devemos correr o risco de sermos megalomaníacos e considerar a filosofia africana a melhor. Todo povo possui sua sabedoria, mas a Sabedoria, assim como Deus, é uma só. A mesma base, os mesmo fundamentos, apenas transmitidos de acordo com a cultura e o lugar de viver correspondente. Se foi através da tradição oral que aprendi, é agora na escrita, iwe-kikó, que encontro condições favoráveis para transmitir, a um maior número de pessoas, os ensinamentos absorvidos e os quais ainda pretendo assimilar, de maneira profunda.
Conheçamos, então, um pouco do muito que possui a filosofia do povo africano:

- É na alegria e na generosidade que se encontra a força que se precisa para enfrentar os obstáculos da vida: “Lé tutu lé tutu bó wá” = “Sigamos em frente alegremente, sigamos em frente iluminados, dividindo o alimento adquirido”.
- A palavra tem o poder de materializar o que existe em potencial no universo, por isso os africanos falam muito e alto, quando precisam canalizar sua energia em direção ao que é essencial, mas silenciam nas horas necessárias. Um orin faz entoar: “Tè rolè… Mã dé tè rolè. Báde tè role” = “Eu venero através do silêncio… Eu pretendo cobrir meus olhos e calar-me. Ser conveniente, respeitando através do silêncio”.
- Nosso maior inimigo (como também nosso maior amigo) somo nós mesmos: “Dáààbòbò mi ti arami” = “Proteja-me de mim mesma”.
- O cuidado com o julgamento do outro e também com o instinto de peversidade: “Bí o ba ri o s’ikà bi o ba esè ta ìká wà di méjì” = “Se vir o corpo de um perverso e chutá-lo, serão dois os perversos”.
- O respeito às diferenças: “Iká kò dógbà” = “Os dedos não são iguais”.
- A necessidade de um permanente contato com a Essência Divina que cada um possui: “Eti èmí óré dé ìyàn. Àroyé èmí óré dé ìyà” = “Na dificuldade de decisão e no debate, a Essência Divina amplia a visão para argumentar”.
Como se vê, o corpo da tradição oral africana, que é composto de itan – mito; oriki – parte do mito que é recitada em forma de louvação e vocação; orin – cântico de louvação; adurá – reza; ówe – provérbio serve para nos disciplinar. Entretanto, nenhuma sabedoria tem mais valor do que a filosofia do ìwà, palavra que pode ser traduzida como conduta, natureza, enfim, caráter. Devemos estar atentos aos nossos comportamentos. Pois, como falam os africanos após enterrar um amigo, “ó kù ó, ó kù ó ìwà ré”, querendo dizer, “não podemos lhe acompanhar no resto de sua viagem, agora só fica você e seus comportamentos”.

fonte:* Artigo publicado na editoria Opinião do Jornal A Tarde, no dia 25/05/2011
 

Postado por ÓRÓ ÓGBÓN (Palavras de Sabedoria)